Este Blog é um espaço para exercitar o olhar antropológico. Os alvos são o cotidiano urbano e as questões relacionadas à educação escolar. Sejam bem-vindos!
Quem sou eu

- Rodrigo Rosistolato
- Sou um antropólogo brasileiro especializado em temas educacionais. Meus trabalhos focalizam as relações existentes entre a educação escolar e outras esferas da vida social. Atualmente, desenvolvo pesquisas sobre estratégias familiares e projetos de escolarização nas camadas populares das cidades do Rio de Janeiro e Petrópolis, ambas no Brasil. A abordagem inclui reflexões sobre a educação básica e o ensino superior. O debate sobre a construção social das juventudes é privilegiado porque permite interpretações refinadas sobre as relações entre educação escolar e expectativas de futuro. Trabalho no Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ onde ensino antropologia e sociologia da educação, além de orientar estudantes interessados no debate entre ciências sociais e educação.
domingo, 29 de abril de 2012
domingo, 15 de abril de 2012
Gilberto Velho morreu. Viva Gilberto Velho!
“A
antropologia acaba de ter uma grande perda. Nossa, de tanto falarmos dele,
parece até que eu o conhecia”.
Foi desta forma que
ontem, 14 de abril de 2012, recebi a notícia da morte de Gilberto Velho. Uma mensagem
de celular enviada por uma de minhas estudantes de iniciação científica. Ela está
no terceiro período do curso de pedagogia da UFRJ e teve, comigo, uma disciplina
de antropologia onde discutimos um dos textos clássicos do autor - “Observando o
familiar” - e falamos sobre a extensa e refinada obra de Gilberto Velho.
Ouso dizer que todos os
antropólogos brasileiros que tiveram, nas últimas quatro décadas, algum interesse
pela antropologia urbana, leram, discutiram ou foram formados por Gilberto Velho.
Trata-se de uma quase onipresença neste campo de estudos que foi, inclusive, progressivamente
revigorado pelo esforço do autor na formação de especialistas. Isso sem contar
com as contribuições que ele ofereceu para a internacionalização da
antropologia brasileira. Dialogou com pesquisadores sobre o Brasil e outros temas, incentivou estudantes para que fossem estudar em
universidades estrangeiras e recebeu os estudantes estrangeiros no Museu Nacional de Antropologia.
A comunidade
antropológica do Brasil prestará muitas e devidas homenagens ao autor. Eu quis
registrar esta, feita de maneira singela por uma jovem estudante que envia uma
mensagem para o professor que a apresentou ao texto do Gilberto Velho e a fez
pensar e sentir como se conhecesse o próprio Gilberto Velho.
O título da postagem
expressa o que penso sobre este fenômeno. Gilberto velho morreu, mas está
vivíssimo em todos os pesquisadores que ele formou. Ele também renasce em cada
estudante de antropologia, ciências sociais, pedagogia... que lê seus textos e
descobre, com certo fascínio, que é possível fazer uma boa antropologia quando
se descobre que os outros podem estar muito próximos fisicamente, mas não
deixam de ser outros, e bem outros.
Viva Gilberto Velho!!!
sexta-feira, 13 de abril de 2012
Nasce o LaPOpe
O Laboratório de Pesquisa em Oportunidades
Educacionais – LaPOpe é fruto do encontro entre sociólogos,
antropólogos e pedagogos que têm a educação como tema de pesquisa. Ele é
composto por Marcio da Costa, Mariane Koslinski, Ana Pires do Prado, Rosana
Heringer, Gabriela Honorato, Silvina Fernandéz e por mim. Todos somos
professores e pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
As pesquisas desenvolvidas no LaPope agregam as metodologias
quantitativa e qualitativa e têm por objetivo ampliar a reflexão sobre os
sistemas educacionais. A perspectiva comparativa orienta as análises e visa
construir conceitos e modelos analíticos que incluam as especificidades de cada
sistema educacional analisado e, simultaneamente, permitam pensar nos sistemas
educacionais de maneira universal.
O LaPOpe funciona na Faculdade de Educação da Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Em breve acontecerá o lançamento oficial de nosso site.
Nele, apresentaremos nossos projetos de pesquisa e disponibilizaremos nossos
artigos e livros. Por enquanto, os contatos podem ser feitos diretamente com os
professores. No meu caso, os contatos também podem ser feitos aqui pelo Blog.
domingo, 1 de abril de 2012
Malinowski e o olhar antropológico
Bronislaw
Malinowski é leitura obrigatória em qualquer curso de antropologia, tanto os
que são montados para alunos de ciências sociais quanto aqueles oferecidos para
estudantes de outras áreas. O autor é usado como exemplo de pesquisa de campo
intensiva, o que envolve problematização, organização, escrita e,
principalmente, treinamento do olhar.
Semana
passada, participei de uma atividade que envolveu professores, estudantes de
graduação e docentes da educação básica. O objetivo era discutir a proposta
metodológica apresentada por Malinowski e iniciar um treinamento em pesquisa
qualitativa, com ênfase na abordagem etnográfica.
Foi um
momento interessante porque aqueles que ainda não conheciam o trabalho de
Malinowski tiveram a oportunidade de apresentar as questões que a leitura do
texto “Objetivo, método e alcance desta
pesquisa[1]”
despertou. Foram muitas questões, principalmente relacionadas ao famoso recurso
narrativo: “Imagine-se...”. Malinowski diz: “Imagine-se de repente desembarcado, rodeado por todo o seu equipamento,
só, numa praia tropical próxima a uma aldeia nativa, enquanto a lancha ou bote
que o trouxe se afasta até desaparecer no horizonte (...)”.
A ideia é
transportar o leitor para o primeiro momento em que o antropólogo se depara
diretamente com o campo; um momento importante para a definição do profissional
que decide fazer antropologia. Ele convida o leitor para um encontro objetivo
com a cultura Trobriand e, simultaneamente, para um encontro subjetivo com o
antropólogo que, naquele momento, estuda os Trobriand.
Quem
parece mais com quem? O leitor pode se sentir identificado com as alegrias e agruras
vividas por Malinowski, mas também pode sentir empatia pela cultura das Ilhas Trobriand.
O recurso “Imagine-se...” neste caso, permite que o leitor passeie pelo texto
malinowskiano como quem passeia por um texto literário. É claro que há diferenças
e distâncias significativas entre o texto literário e o texto antropológico,
mas... em ambos os casos o autor precisa contar uma história par um leitor
desconhecido.
No bate-papo
com os professores da educação básica, as identificações mais frequentes ocorreram
entre eles e Malinowski. A justitifcativa pode estar no fato de eles terem lido
apenas o capítulo que fala do método. Neste, os nativos das Ilhas Trobriand
aparecem, mas muito pouco. Mas há outras leituras possíveis: os professores
imaginaram a situação, se colocaram no lugar de Malinowski e pensaram no que
fariam neste contexto.
O recado
final do texto de Malinowski é: a antropologia precisa compreender o mundo com
base na perspectiva do outro. Encontrar e analisar o “ponto de vista do nativo”
passou a ser, a partir de Malinowski, a principal obsessão dos antropólogos. Ela
tem nos guiado, inclusive, na antropologia urbana onde há a ilusão inicial de
que os outros não são tão outros assim.
O recado
final da atividade que desenvolvi com os professores é: quando levamos o
recurso “Imagine-se...” às últimas consequências, podemos aplicar a proposta
malinowskiana à leitura do próprio texto de Malinowski. De certa forma, quando
os professores simpatizaram com Malinowski o fizeram porque estavam respeitando o
ponto de vista de Malinowski sobre aquele mundo que ele próprio apresentava aos
seus leitores.
E você, o
que acha disso? Deixe seu comentário.
Um detalhe: recebi alguns e-mails onde leitores reclamavam da necessidade de identificação para a postagem de comentários. Atendendo a pedidos... liberei as postagens. Não há necessidade de identificação.
[1]
Publicado em GUIMARÃES, A. Z. Desvendando Máscaras
Sociais. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1980.
domingo, 18 de março de 2012
Conversa de taxista: a praia, o metrô e a diferença.
Uma das coisas mais
interessantes no Rio de Janeiro é andar de táxi. O serviço não é dos mais
baratos, nem dos melhores, mas o tempo que se passa junto aos taxistas pode
ensinar sobre as coisas da vida.
No verão de 2011 peguei
um taxi em Ipanema. Seguia em direção ao Largo do Machado quando o motorista
começou a puxar conversa. Perguntou se eu estava na praia e eu disse que não. Ele
respondeu: “faz o senhor muito bem!”. Não entendi a colocação, muito menos a
ênfase e decidi perguntar por quais motivos ele considerava que não seria bom
estar na praia. Foi o suficiente para o taxista contar toda sua história familiar
até chegar aos motivos da afirmação.
Ele contou que nasceu
em uma família de classe média alta, que vivia em Copacabana. Com a morte do
pai, os bens da família foram sumindo porque não havia ninguém que sustentasse
os luxos, o padrão e o estilo de vida. Simbolicamente, a família ainda se
pensava e se auto-representava como uma família de classe média alta, mas
materialmente estava cada vez mais próxima das classes trabalhadoras.
Com o passar dos anos,
a situação financeira piorou ainda mais, os bens foram vendidos e o patrimônio
quase desapareceu. Como herança, sobrou o apartamento de Copacabana e uma
pequena quantia em dinheiro. O que fazer? Sua decisão foi comprar um táxi
porque já que teria que trabalhar seria melhor trabalhar por conta própria. Ele
não suportaria horários fixos e um patrão. Além disso, poderia continuar
vivendo e convivendo em Copacabana.
Depois da história
familiar ele emendou dizendo que se sentia muito feliz por não gostar mais de
ir à praia. Comentou que frequentara a praia por muitos anos e que passara a
adolescência e boa parte da juventude com seus amigos na praia. Foi quando disse
que naquela época a praia era outra: cheia de gente bonita, com pessoas
agradáveis que aproveitavam o sol para um mergulho, leitura ou conversa
silenciosa com os amigos. Agora, diz ele, não se consegue mais nada disso em
Copacabana. “É uma farofada, gente ouvindo música alta, ninguém mais lê e a
praia vive lotada”. Seu diagnóstico dizia: “é culpa do metrô”. Ele afirmou com
toda ênfase que antes da chegada do metrô a praia era diferente.
E ele completou: o
senhor pode se preparar porque vai acontecer a mesma coisa com Ipanema. Agora
que o Metrô está por lá, pode esquecer. Ipanema vai acabar da mesma forma que
Copacabana acabou. No final de semana, então, será impossível!
Minha conversa com o taxista
me fez pensar em uma das temáticas que fundaram a moderna reflexão
antropológica: o debate sobre a construção social da diferença. Ele identificava a decadência material de sua família
como um problema, mas não a associava à “decadência” dos modos de vida e
padrões de comportamento. Chegou a dizer que trabalhava como taxista, mas não
era muito taxista. Separava, portanto, sua existência profissional da existência
profissional dos outros taxistas. Ele era um “cara de Copacabana” e não aceitava
que outras pessoas “invadissem” o espaço que classificava como seu. Em seu
discurso estava implícito que essas pessoas que comem farofa, ouvem músicas
altas, e falam o tempo todo não podem ser pessoas de Copacabana. Por isso, ele estava
decidido e concluiu toda a história dizendo: “nunca mais irei à praia”. A sentença
era justificada da seguinte forma: “porque a praia acabou”.
Quando deixei o taxi fiquei
pensando na conversa e no metrô. É incrível como um transporte público aproxima
as pessoas geograficamente e, ao mesmo tempo, faz com que os processos
simbólicos de construção das diferenças sejam ampliados e até mesmo
exacerbados. É claro que o taxista apresenta uma visão que não é,
evidentemente, a visão de todos os moradores de Copacabana, mas é uma visão de alguém que reside em Copacabana. Às vezes, a ampliação da proximidade geográfica aumenta, simultaneamente,
as distâncias culturais, mas também podem surgir movimentos interessantes no meio
deste espaço de conflito.
Seria bom saber o que pensam sobre os moradores de Copacabana aqueles que não vivem no Bairro e usam o metrô para ir à praia. Não vou me alongar. Afinal, é apenas uma postagem. Muitos
antropólogos competentes já estudaram as areias cariocas e os bairros da zona
sul: Mirian Goldenberg, Gilberto Velho, Fabiano Gontijo, Patrícia Farias, Marisol
Goia, Stéphane Malysse, entre muitos outros. Vale a pena lê-los.
domingo, 11 de março de 2012
Quem ocupa o trono tem culpa, quem oculta o crime também...
A canção “somos quem podemos ser”, do grupo "Engenheiros
do Hawaii" sempre chamou minha atenção. Na época, década de 1980, havia uma
certa “resistência carioca” à banda gaúcha. Em minha opinião, Humberto Gessinger
é um dos grandes poetas do Rock Brazuca, mas sua poesia com um toque
regionalista não agradava aos cosmopolitismos do sudeste.
Polêmicas à parte, meu
objetivo não é discutir a cena rock brasileira nos anos 1980. Eu utilizei esta
frase em sala de aula quando um estudante perguntou sobre os verdadeiros
culpados do fracasso da educação brasileira. Foi engraçado porque os alunos mais
jovens não entenderam a citação. Tive que explicar, mas acabou fazendo
sentido no final.
Utilizei a frase porque
nos últimos anos tenho formado professores e pesquisado em contextos escolares.
O fracasso da educação pública no Brasil é um consenso, bem perigoso, diga-se
de passagem. Por isso, dedico parte de minhas aulas à problematização da ideia de
fracasso e ao debate sobre as hierarquias de desempenho presentes nos sistemas
educacionais. Há, em todos os sistemas, processos de segmentação que fazem com
que as escolas sejam muito diferentes. Quando falo sobre isso, não consigo
fugir da pergunta: mas de quem é a culpa?
Os estudantes, com muita
frequência, querem crucificar alguém e este alguém ganha diversas faces no
debate. O culpado é o governo, o Banco Mundial, a falta de estrutura nas
escolas, os salários dos professores, o nível socioeconômico das famílias e por
ai vai. Estas falas também estão presentes nas narrativas de professores,
gestores e até mesmo de alguns especialistas em educação.
Quando utilizei o verso
da música, propus um debate sobre responsabilidades individuais. Disse aos
estudantes que o problema é mais complexo e que a caça às bruxas ou a busca
pela Geni (aquela que é boa de cuspir) atrapalha qualquer reflexão mais
consistente sobre educação. É preciso pensar nas responsabilidades do Estado,
nas influências internacionais, no salário dos professores, no nível socioeconômico
das famílias, mas também nas atividades docentes, nas crenças dos professores
sobre a capacidade intelectual dos estudantes, no tempo realmente utilizado
para atividades de ensino e nas expectativas dos professores sobre sua própria
profissão.
Minha discussão sobre o
suposto fracasso educacional brasileiro também visa chamar atenção dos futuros
professores para suas responsabilidades com o ensino. Eles, em geral, não
querem ser professores, mesmo estudando em cursos de licenciatura. Esta contradição
ilustra a complexidade deste debate. Nestes casos, sempre procuro deixar um
recado: a profissão docente tem que ser uma escolha e melhor seria se aqueles
que a escolhem, escolhessem com vontade de fazer a diferença nas escolas em que
estiverem trabalhando. Somos quem podemos
ser, mas também podemos encontrar as chaves que abrem a prisão criada pelo
desânimo relacionado à escola e aos sistemas educacionais. Afinal, o melhor
professor é aquele que ensina acreditando que todos os estudantes podem
aprender. Para isso, é preciso ânimo!
E você, o que pensa
sobre a educação e a profissão docente no Brasil? Deixe seu comentário.
sábado, 3 de março de 2012
Pesquisas comparativas e eventos científicos: o treinamento do olhar.
Pesquisas comparativas
tendem a produzir contribuições importantes para o debate científico em torno
de uma área de conhecimento. A principal dificuldade é estabelecer os critérios
de comparabilidade para que não se misture, como diz o ditado popular, “alho
com bugalho”. Antes de comparar, é necessário discutir os limites e as
fronteiras das comparações propostas, o que se dá em longas e produtivas
conversas acadêmicas. Elas são importantes para o treinamento do olhar
sociológico, e também do olhar antropológico.
Eventos científicos são
excelentes espaços para este tipo de conversa. São momentos em que
pesquisadores de diferentes origens apresentam suas pesquisas e conhecem trabalhos
convergentes com os que estão realizando. Por isso, além de grandes espaços de
sociabilidade, os Congressos, Seminários, Simpósios, são espaços de muito
trabalho e troca de conhecimentos. Eles também permitem que pesquisadores
iniciantes (graduandos, mestrandos, doutorandos), convivam com os mais experientes
e apreendam as minúcias presentes no cotidiano da pesquisa.
A sociologia da
educação trabalha com temas abrangentes, dentre os quais a análise da
distribuição de oportunidades educacionais. É um campo vigoroso que ganha muito
com comparações entre sistemas escolares presentes em países diferentes. De 25 a 27 de julho de 2012 teremos a
oportunidade de discutir este e outros temas no III Colóquio Luso-Brasileiro de
Sociologia da Educação. O evento acontecerá no campus Praia Vermelha, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Jovens
e experientes pesquisadores interessados no debate entre Ciências Sociais e
Educação poderão inscrever trabalhos e/ou participar do evento. O Colóquio foi
organizado por uma equipe composta por pesquisadores renomados no Brasil e em
Portugal. São eles:
Comissão organizadora
Brasileira: Lea Pinheiro Paixão (UFF), Marcio Costa (UFRJ), Paulo Carrano (UFF)
e Zaia Brandão (PUC-Rio).
Comissão organizadora Portuguesa:
Ana Matias Diogo (UAC), Lia Pappamikail (IPS) e Maria Benedita Portugal Melo (UL).
Comissão científica
Brasileira: Maria Alice Nogueira (UFMG), Juarez Dayrel (UFMG), Marília Pinto
Carvalho (USP) e Graça Setton (USP)
Comissão científica
Portuguesa: Maria Manuel Vieira (ICS), José Resende (UNL) e João Teixeira
Lopes.
Eu
estarei lá! E você, que tal treinar o olhar antropológico neste evento?
Maiores informações
estão disponíveis em: http://www.coloquiolusobrasileiro.com/
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