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Sou um antropólogo brasileiro especializado em temas educacionais. Meus trabalhos focalizam as relações existentes entre a educação escolar e outras esferas da vida social. Atualmente, desenvolvo pesquisas sobre estratégias familiares e projetos de escolarização nas camadas populares das cidades do Rio de Janeiro e Petrópolis, ambas no Brasil. A abordagem inclui reflexões sobre a educação básica e o ensino superior. O debate sobre a construção social das juventudes é privilegiado porque permite interpretações refinadas sobre as relações entre educação escolar e expectativas de futuro. Trabalho no Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ onde ensino antropologia e sociologia da educação, além de orientar estudantes interessados no debate entre ciências sociais e educação.

domingo, 10 de maio de 2020

A mãe da minha mãe e os tomatinhos.


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Eu adoro tomate sweet grape. Esse tipo é especial porque me remete a memórias deliciosas da minha infância. Minha avó gostava de ter uma horta. Ela plantava couve, jiló, mandioca e tudo o mais que dava na telha. As verduras, principalmente, ficavam ali, fresquinhas, e ela colhia de acordo com a vontade de comê-las. Essa tradição é muito comum no interior das Minas Gerais. Boa parte do almoço fica ali no quintal da casa, e o cardápio é definido de acordo com o que está disponível no momento e com a vontade de comer.
Eu me lembro nitidamente do quintal da minha avó. Já se passaram 30 anos desde que o vi pela última vez. Foi um momento muito triste, em que ela era velada na sala de estar da casa. Pois é. Naquela época os mortos eram velados em casa e foi assim que me despedi da minha avó e de todo o mundo que ela construiu na sua casinha na beira do rio. Depois disso, voltei à casa somente uma vez, mas já não era a casa dela. Era um imóvel, já ocupado por outra família. Todo o universo simbólico que envolvia aquela propriedade foi-se junto com minha avó.
Mas o que tudo isso tem a ver com tomate? Certa vez, eu era bem pequenininho, provavelmente tinha uns 10 anos de idade; saí de Petrópolis com minha família e fomos visitar a minha avó. Assim que ela abriu o portão, eu pulei em cima dela e dei de cara com um pé de sweep grape repleto de tomatinhos já maduros. Foi um encantamento só. Ela percebeu e disse algo do tipo: “é para você, meu filho, estava te esperando pra gente colher”. Corri imediatamente para os tomates, colhi todos e comi boa parte deles ali mesmo, enquanto meus pais morriam de rir com aquela euforia de criança.
Essa história resume três das coisas mais importantes que minha avó ensinou para mim e para minha mãe: afeto, cuidado e paciência. Ela tinha calculado o tempo necessário para plantar e ver crescer os tomates de forma que eu chegasse na hora certa de colhê-los. As quantidades de afeto, cuidado e paciência presentes nessa atitude são incomensuráveis, e eu adoraria dizer a ela o quanto me marcou. Infelizmente ela se foi e não vai saber disso. Hoje eu posso apenas lembrar essa história. Talvez minha mãe se lembre, talvez não. Não sei. É uma história do amor que a mãe dela sentia por mim. Um amor tão incondicional quanto o que ela guarda por mim, por meus irmãos e meus sobrinhos.
É impossível para um filho entender o que é ser mãe. Só as mães sabem e acho bem bom que fique como um segredo delas. Mas aquele menino que colhia tomatinhos plantados e cuidados para ele tinha certeza de que ali ele era a pessoa mais importante do mundo. Foi isso que minha avó e minha mãe fizeram por mim, e nunca pediram absolutamente nada em troca.
Muito obrigado, minha mãe. Muito obrigado, minha avó. O amor que está em mim é o que veio de vocês.