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Sou um antropólogo brasileiro especializado em temas educacionais. Meus trabalhos focalizam as relações existentes entre a educação escolar e outras esferas da vida social. Atualmente, desenvolvo pesquisas sobre estratégias familiares e projetos de escolarização nas camadas populares das cidades do Rio de Janeiro e Petrópolis, ambas no Brasil. A abordagem inclui reflexões sobre a educação básica e o ensino superior. O debate sobre a construção social das juventudes é privilegiado porque permite interpretações refinadas sobre as relações entre educação escolar e expectativas de futuro. Trabalho no Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ onde ensino antropologia e sociologia da educação, além de orientar estudantes interessados no debate entre ciências sociais e educação.

sábado, 12 de dezembro de 2020

Adeus, Ubirany. Quantas saudades a tua voz e a tua defesa do subúrbio deixarão!

Ubirany Félix do Nascimento morreu. Mais uma das vítimas da pandemia. Ele se foi, mas sua voz e suas realizações no mundo do samba deixaram marcar indeléveis na cultura brasileira em geral e na cultura carioca em particular.

Ubirany é reconhecido como um dos membros fundadores do grupo Fundo de Quintal e como o inventor do repique de mão. Isso tudo é verdade e o reconhecimento é mais do que legítimo. Aliás, trata-se de um inventor de um instrumento hoje produzido e vendido no Brasil inteiro e em boa parte do mundo, e que nunca foi patenteado pelo seu inventor. Bom, é como diz o samba do Candeia, “o sambista não precisa ser membro da academia. Ser natural com sua poesia e o povo lhe faz imortal...”.

Todas essas conquistas são impressionantes, mas eu quero ressaltar outro lado do Ubirany. Aquele ligado à identificação e a defesa da “cultura suburbana” do Rio de Janeiro. Ele sempre se apresentou como um homem do subúrbio, que tinha orgulho de ter nascido e vivido no subúrbio e que trazia outra perspectiva dessa cidade, apresentada pelos bairros recortados pela linha do trem. Ele era um homem de fala serena, que fazia questão de enfatizar que respeitava todos os tipos de música, mas que gostava mesmo era de fazer e cantar samba. Não foi um artista pensado – em termos de projeto – para ser artista. Como ele mesmo conta, a história do repique de mão começou quando ele estava em um samba na casa de amigos, tocando em um balde de alumínio, tudo em parte como obra do acaso. O mesmo aconteceu com o Cacique de Ramos e com o Fundo de Quintal. Não havia um projeto artístico cultural stricto sensu, mas sim o desejo de encontrar as pessoas, conversar, tocar e cantar samba; tudo sempre abençoado pelos orixás que guardavam a cabeça de sua falecida mãe e dele também.

Samba, candomblé, umbanda, carnaval, amizade, encontros fortuitos e despretensiosos. Era nesse mar que Ubirany navegava e foi assim que se tornou um ícone da cultura popular. O samba feito no fundo do quintal ganhou o Brasil e o mundo e ele, junto de seus parceiros, tornou-se uma referência nacional. Para aqueles que gostam de samba, vale a pena ouvir os discos do Fundo de Quintal e cantar junto todas as músicas que iluminam nosso mundo do samba, tanto aquelas escritas por eles quanto as pérolas de outros compositores consagrados nas vozes do grupo. Para aqueles que não gostam de samba, só tenho a dizer o seguinte: nunca é tarde!

Ubirany deixará muitas saudades. O mundo do samba chora e todos nós temos a obrigação de cuidar do legado cultural deixado por ele. De forma refinada e sutil ele sempre deixou claro que a cultura carioca é muito maior do que pensamos, que o subúrbio pulsa e que a poesia não tem lugar de nascimento. Ela está em todos e para todos.

Salve Ubirany! E que os orixás te guiem!!!

Deixo aqui uma das minhas preferidas. “Sonho de Valsa”, um samba triste, com metáforas impressionantes e carregado de sentimentos.

https://www.youtube.com/watch?v=6D9Pyp1RFy8